
O Brasil enfrenta uma epidemia de 'burnout'?
15/08/2024por Revista VisualA jornada de trabalho que chegava a durar 16 horas por dia, o excesso de responsabilidades e o sentimento de viver em função do emprego foram cruciais para que Juliana Ramos de Castro, de 41 anos, desenvolvesse uma síndrome de burnout.
Os primeiros sinais apareceram, em 2020, quando a nutricionista trabalhava como autônoma.
“Na época, acreditava que o que estava sentido era crise de ansiedade e fui levando o consultório até conseguir um trabalho em uma empresa em meados de 2022”, conta Juliana.
Quando assumiu um cargo de gerente, com uma jornada de trabalho extenuante, os sintomas, que até então oscilavam, tornaram-se frequentes.
“Ao mesmo tempo, eram constantes as dores no peito, tontura, crises de choro, confusão mental e isolamento social. Não havia um gatilho para acontecer, simplesmente vinha, em qualquer lugar e momento.”
Ao procurar ajuda médica, Juliana descobriu que o que acreditava ser ansiedade era, na verdade, burnout.
Essa síndrome ocupacional é causada por um estresse crônico na vida profissional e se caracteriza também, além da exaustão, por um sentimento de negatividade em relação ao trabalho e uma piora do desempenho.
“Fiquei surpresa, fui afastada pelo médico psiquiatra do trabalho por 60 dias. E quando voltei, resolvi pedir demissão e mudar de área", conta Juliana, que hoje trabalha como analista de um escritório de advocacia, um ambiente de trabalho que ela considera "mais saudável”.
Em 2023, 421 pessoas foram afastadas do trabalho por burnout — é o maior número dos últimos dez anos no Brasil, segundo dados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), do Ministério da Previdência Social.
O aumento ocorreu, principalmente, durante a pandemia do coronavírus. De 178 afastamentos por burnout, em 2019, o Brasil passou para 421, em 2023, um aumento de 136%.
Em uma década, o número de afastamentos por este motivo cresceu quase 1.000%, como mostra o gráfico abaixo.
Para especialistas ouvidos pela BBC News Brasil, três fatores ajudam a explicar este crescimento de diagnósticos de burnout no país:
Maior conhecimento da população sobre transtornos e síndromes relacionados ao trabalho, principalmente, a partir do reconhecimento da Organização Mundial da Saúde (OMS) do burnout como uma síndrome ocupacional;
Maior nível de cobrança sobre trabalhadores no ambiente organizacional, o que culmina em pressão e estresse, desencadeadores de transtornos e síndromes;
E confusão de especialistas na hora de identificar se o paciente tem burnout ou outros transtornos mentais relacionados ao trabalho.
Hoje, estima-se que 40% das pessoas economicamente ativas sofram de burnout, aponta Alexandrina Meleiro, médica psiquiatra e porta-voz da Associação Nacional de Medicina do Trabalho (ANAMT).
"Mas nem todos os casos são identificados", diz a especialista.
No Brasil, as únicas estatísticas oficiais disponíveis em relação à síndrome de burnout são contabilizadas pelo Ministério da Previdência Social, que apenas afere os afastamentos do trabalho por mais de 15 dias.
Os afastamentos por burnout por menos tempo não são contabilizados nas estatísticas oficiais.
Além disso, segundo Antônio Geraldo da Silva, presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), atualmente, uma resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) estabelece que o médico é obrigado a provar que há uma relação entre o trabalho e o esgotamento profissional.
“Assim, pelo CFM, o médico psiquiatra somente pode afirmar que o paciente tem burnout se visitar pessoalmente o local de serviço e fizer nexo causal”, diz Silva.
"Atendimentos apenas em consultórios não podem fazer tal diagnóstico."
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